O
livro trata de Antonio Jorge da Silva, um homem de 84 anos que passa a viver
num asilo após a morte de sua mulher. Apesar da premissa envolver um tema
delicado e muito possivelmente triste e pesado, a forma que o escritor
transmite tudo não deixa o livro ser um fardo para o leitor. Pelo contrário.
Escrita poética, não rebuscada, coisa linda de ser ler mesmo. A historia não
deixa de ser triste, mas a todo momento, a personagem principal exprime seus
pensamentos e sentimentos, deixando transparecer a raiva e a ironia, dando um
toque muito especial à narrativa, que é feita em primeira pessoa pelo próprio
Silva. A trama tem como pano de fundo a época da ditadura salazarista em
Portugal, que é tratada de modo secundário mas insistente pelo autor durante
toda a obra. Através do tema da velhice, valter hugo mãe discorre sobre temas
universais, como o amor, a perda, a amizade e a morte.
Eu
amei esse livro. Amei valter hugo mãe e seu jeito de escrever maravilhoso.
Aconteceu com ele o mesmo que aconteceu com o John Green. A historia não traz
uma premissa inovadora, mas o livro é o que é pela narrativa dos autores. Com a
diferença de que o mãe é mais denso nas questões que ele aborda. Só uma coisa
me incomodou: o fato de ele não usar maiúsculas e não separar os diálogos com
dois pontos e travessão. Isso dificulta a leitura no começo, mas não é difícil
de se acostumar (palavra de alguém que facilmente teria abandonado o livro,
caso fosse grave). Me identifiquei em muito com o Silva... foi assustador ver
como ele parecia estar falando de dentro da minha cabeça em alguns momentos
(talvez eu esteja ficando velha antes do tempo hahaha). Foi triste não poder
marcar as varias passagens em que parei para absorver a beleza daquilo. Como o
livro era emprestado da biblioteca, só pude copiar as frases... Segue algumas
para vocês verem do que eu to falando:
E eu
sorri. Senti-me um idiota por dentro, mas sorri. Era da cultura, o estupor da
cultura que nos mascara cada gesto. Pág. 26
Sonhar
um mundo é correr riscos ainda maiores. É ser-se ambicioso perante o que já é
impossível. - Pág. 53
O
Américo esperou uns segundos por que me acalmasse. Procurou um silencio limpo
como uma folha muito limpa onde pudesse escrever uma frase mais digna e disse,
um dia essa saudade vai ser benigna. A lembrança da sua esposa vai trazer-lhe
um sorriso aos lábios porque é isso que a saudade faz, constrói uma memória que
nós nos orgulhamos de guardar, como um troféu de vida. Um dia, senhor silva, a
sua esposa vai ser uma memória que já não dói e que lhe traz apenas felicidade
de ter partilhado consigo um amor incrível que não pode mais fazê-lo sofrer,
apenas levá-lo à gloria de o ter vivido, de o ter merecido. Tenho até inveja de
si, senhor Silva, porque eu tenho trinta e um anos e estou por aqui solteiro,
já não vou a tempo de ter cinqüenta anos de uma grande paixão. – pág. 77
Aceitar
que apenas a gestão do tempo pode fazer-nos escapar à loucura. – pág. 101
Sentir
o que não existe é uma qualquer saudade de nós próprios. Muita coisa é apenas
uma saudade. Muitos dos sentimentos. É como lhe digo. Sabe, até o suspirarmos
por alguma acalmia que havia antes da revolução. Ó senhor Cristiano, não vai
falar outra vez do regime. Não é isso, é que é importante pensar nestas coisas,
respondia ele. (...) temos medo destes novos tempos, não são os nossos tempos,
e precisamos de nos defendermos. Quando dizemos que antigamente é que era bom
estamos só a ter saudades, querermos na verdade dizer que antigamente éramos
novos, reconhecíamos o mundo como nosso e não tínhamos dores de costas ou
reumatismo. É uma saudade de nós próprios, e não exatamente do regime e menos
ainda de salazar. – pág. 116
A
mulher corava novamente e desse modo se calavam por um instante, a pensar
nessas levezas que não tem sequer dicionário e obrigam uma pessoa a depender da
outra pelo lado mais delicado da beleza. – pág. 219
Depois
confessei-lhe, precisava deste resto de solidão para aprender sobre este resto
de companhia, este resto de vida, Américo, que eu julguei já ser um excesso,
uma aberração, deu-me estes amigos. E eu que nunca percebi a amizade, nunca
esperei nada da solidariedade, apenas da contingência da coabitação, um certo
ir obedecendo, ser carneiro. Eu precisava deste resto de solidão para aprender
sobre este resto de amizade. Hoje percebo que tenho pena da minha Laura por não
ter sido ela a sobreviver-me e a encontrar nas suas dores caminhos quase
insondáveis para novas realidades, para os outos. Os outros, Américo,
justificam suficientemente a vida, e eu nunca o diria. Esgotei sempre tudo na
Laura e nos miúdos. Esgotei tudo demasiado perto de mim, e poderia ter ido mais
longe. – pág. 237
Perguntava-me
por que não deixar que ficassem. Seriam uma historia bonita no feliz idade. E
eu respondia que não, não queria, que as historias bonitas aconteciam por
acaso, e eu acabara de aprender que a vida tem de ser mais à deriva, mais ao
acaso, porque quem se guarda de tudo foge de tudo. – pág. 245
Sentiram
o drama? Selecionei e mesmo assim ficaram muitas! Preciso falar que vale a pena
ler?
5
estrelas
PS:
gente, tenho problemas com títulos e suas mensagens nas entrelinhas. Deu pra
perceber né... Então, alma bondosa, leitor inteligente: caridade por favor,
seja gentil e explique para a minha pessoa o porquê de ser A máquina de fazer
espanhóis. Grata.
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